domingo, 14 de setembro de 2014

Mudanças

Aquela mesma porta antiga, com as mesmas pequenas rachaduras localizadas nos mesmos lugares. A maçaneta quase enferrujada por não ter sido tocada a anos. A porta que sempre esteve ali e ninguém notou. Será que nos levará a outro comodo? Ou outro universo? Ninguém nunca fez questão de se perguntar.
Até que um dia decidi me virar de costas para o mundo e a vi. Estava lá, as mesmas rachaduras, os mesmos arranhões, a mesma porta. Na beira do precipício, a porta. 
Caminhamos em uníssono em direção a ela, mas cada um tomou uma decisão. Minha porta, minhas regras, minha consciência, meus atos. Não é assim que funciona?!
Girei a maçaneta que há tempos não era tocada e abri, assim, a porta. O vento balançou meus cabelos e quase fui jogada pra trás, mas logo encontrei o ponto de equilíbrio.
A porta. O ponto de chegada e o ponto de partida. A limiar entre quem vai e quem fica. É assim que deve funcionar daqui pra frente. 
Anos depois, soube de histórias de gente que tomou a mesma decisão e não ficaram apenas parados em direção a grande limiar.
Soube a história de duas garotas, cada uma empurrou a outra para o lado de fora de sua porta. Depois de tantos anos, essa foi a decisão tomada. Era melhor abrir a porta e deixa-la ir embora, estava cansada de ficar juntando os caquinhos de seu coração despedaçada - foi o que uma delas disse.
Há memórias de um adolescente que decidiu atravessar a limiar. A grande limiar entre a vida e a morte. Só queria um lugar melhor pra se viver, já que não se deve temer a morte - e sim a vida, ela sim é de tamanho mistério. O garoto, cansado de tudo pelo que vinha passando, simplesmente se deixou levar. Deixou-se levar após tantos e tantos remédios para curar sua depressão. Deixou-se levar após ter sido trancado em um quarto escuro por dias até que alguém viesse o tirar dali - exatamente com esse termo, pois ninguém realmente se importava. Esperou que o vento o levasse para fora - e foi.
Ela tentou joga-lo do penhasco, fez toda a força que conseguia. Simplesmente não queria ser a granada prestes a explodir. Sabia que não poderia lidar com tudo aquilo e não queria de forma alguma magoa-lo. A força foi tamanha que o garoto quase não aguentou. Mas ele continuou. Continuou firme e forte. Há relatos de outros casos assim, entre amigos, irmãos, entre família, até entre "desconhecidos". Não deixou que fosse levado para fora. Estava ali por ela e para ela. Não foi embora. Ele escolheu ficar. Essas são aquelas pessoas com quem sempre é possível contar, mesmo quando você não quer, mesmo quando tudo o que você quer é sumir, bom, elas não permitirão que sejam colocadas do lado de fora.
É a sua porta. É sua vida. São as suas decisões. Até quando vale a pena se importar com alguém que não se importa? Até quando vale a pena fazer de tudo e ser reconhecido apenas pelos seus erros? Até que ponto vale a pena amar sem ser amado? Até quando é preciso se apegar em alguém que você sabe não ser um bom caminho? É preciso tudo isso? Quantos cacos de vidro é preciso juntar até que tomemos essa decisão? Quantas vidas terão que ser desperdiçadas até que outros comecem a se fixar bem ali no meio e não se deixar levar para o outro lado da porta?
Não há nenhum momento exato, nada é cronometrado e não tem como saber. Alguns nunca precisaram abrir a porta. Outros abrem e fecham a todo instante. Mas sempre há um tempo em que é preciso mudar.
Há um determinado instante em que é preciso fechar os olhos, virar-se de costas para o mundo, caminhar até a porta, girar a maçaneta e deixar que o vento traga as coisas boas e leve todas as ruins. É tempo de mudanças.

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